Seguindo por nossa investigação sobre o Movimento Martinista na Rússia, vejamos o desenvolvimento da corrente na Rússia a partir do momento em que a Ordem Martinista foi estabelecida na França. Referimo-nos ao fim do século XIX, período do governo dos últimos Romanov, e ao Martinismo mais bem organizado, que formava uma síntese do sistema de livre-iniciação de Louis-Claude de Saint-Martin com o sistema hierárquico de Jean Baptiste Willermoz.
Nesse período, as princesas Melissa e Anastasia Petrovic-Negosc de Montenegro viajavam muito junto ao Grande Duque Nicholas Romanov e a Peter Romanov, seus respectivos maridos. Em Paris, no ano de 1890, conheceram Papus (1865 -1916) e Maitre Nizier Antheime Phillippe de Lyon (1849-1905). Elas se graduaram na Academia de Kabbalah de Papus e foram as responsáveis pela ponte por meio da qual Papus e Phillippe de Lyon foram três vezes para a Rússia. A grande expectativa naquele momento era a de que os Magos Franceses pudessem solucionar problemas relacionados à sucessão dos Romanov e, nesse período, Phillippe de Lyon chegou a ser nomeado Chefe Inspetor Sanitarista da Rússia por Nicolau II. Desse modo, adquiriu não apenas a licença médica necessária para atuar na Rússia, mas também uma posição na hierarquia militar russa. Depois que Papus e Phillippe desapontaram as expectativas da corte, as mesmas princesas foram as responsáveis por encontrar o controverso Rasputin e trazê-lo para dentro do círculo nobiliárquico.
De acordo com Philippe Encausse, a partir do período em que seu pai, Papus, esteve presente na Rússia, um grupo martinista havia sido organizado pelo Grão Duque Nicholas Nicolaevitch. O grupo foi batizado como A Cruz e a Estrela. Com Ivan Antoshevsky, Papus também criou a publicação ocultista Isida, que posteriormente publicará o rito dos Capítulos dos Cavaleiros Espirituais de Lopukhin, que foi traduzidos por Vladimir Fedorovich Savodnik (1874-1940), um estudante de Vladimir Sergeevich Soloviev (1853-1900).
Olga Mussina-Pushikina (1861-1922), em 1899, foi nomeada por Papus a primeira Inspetora da Ordem Martinista para a Rússia. Como não dispunha das condições necessárias para realmente exercer o ofício, ela acabou se demitindo depois de algum tempo. Valerian Muravyov-Amursky (1864-1947) foi o segundo Inspetor da Ordem Martinista para a Rússia. Ele acreditava que o Martinismo seria a força espiritual que se oporia ao que considerava ser a malévola tradição maçônica e, quando entendeu que estava completamente enganado, considerou que o Martinismo também seria uma destas forças conectadas com a maçonaria e se demitiu. Czeslaw Czynski (1858-1932) foi o terceiro Inspetor. Nesse período, três Lojas da Ordem Martinista foram estabelecidas.
Peter Kaznacheyev (1854-1931) foi o Filósofo Desconhecido da Loja de São João em Moscou. Em Kiev, a Loja de Santo André Apóstolo tinha Serge Marcotoune, iniciado de Olga Mussina-Pushikina, como Filósofo Desconhecido. Foi Gregory Mebes (1868-1930/1934), entretanto, o primeiro a abrir uma Loja Martinista russa em São Petersburgo. Ele havia sido iniciado por Czynski e batizou a Loja de Apolonius de Tiana. Depois que Czynski se afastou, Mebes e Kaznancheyev disputaram a representação da Ordem Martinista e, insatisfeito com a decisão final do Supremo Conselho, em 1912, Mebes constituiu o Rito Martinista Autônomo em São Petersburgo. Mebes travou contato íntimo com Valentin Tomberg, que havia estudado com os Velhos Crentes e com os Rosa-Cruzes herméticos de Moscou em 1919. A tradição de Mebes, oriunda não apenas da Ordem Martinista de Papus, mas também do Triângulo de Golitsyn, foi mais bem preservada e perpetuada por Nicholas Rogalev, que a estabeleceu na América do Sul. Elementos templários e rosacrucianos estavam muito presentes nessa escola que, de maneira bastante discreta, transmitia a iniciação na patente de Cavaleiro Rosae-Crucis (hoje preservada, à título de ilustração, no seio da Ordem dos Irmãos Iluminados da R+C).
Após a morte de Papus, Serge Marcotoune foi confirmado como Filósofo Desconhecido por Jean Bricaud e estabelecido Delegado Geral da Ordem Martinista para a Ucrânia. Depois de refugiado na França por conta da revolução, Marcotoune recebeu de Bricaud a patente para a Loja de Santo André nº 2, uma homenagem à primeira Loja de Santo André em Kiev. Foi de Serge Marcotoune que Armand Toussaint recebeu a luz martinista.
Quando Marcotoune deixa a França em favor das Ilhas Canárias, ele estabeleceu Yury Terapiano (1892-1980) como seu herdeiro legítimo. Terapiano havia sido iniciado na Ordem Martinista por Papus. Robert Ambelain (1907-1997), depois de sua crise espiritual de 1967, quando se afastou por um período do cristianismo, entrou em contato com essa corrente e, a partir dela, criou a Ordem Martinista Iniciática. De má fé ou iludido por fantasias, Ambelain procurou sustentar que a verdadeira linhagem Martinista seria a russa e que haveria a necessidade de todos os Martinistas de origem francesa retificarem suas iniciações e linhagens, desconsiderando completamente a origem papusiana da linhagem que ele mesmo havia recebido. Ainda que esses fatos tenham sido suficientemente esclarecidos por pesquisadores de boa envergadura, como Serge Caillet, a história segue sendo reproduzida em sua versão inconsistente e fantasiosa.
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