GuR+C, a Rosa+Cruz Dourada

Quando falamos de Ordens Rosacruzes a maioria das pessoas lembra ou conhece apenas das Ordens que começaram a existir da segunda metade do Século XIX em diante, pouco sabendo das Ordens que existiram no Século XVIII e na primeira metade do século subsequente. Dentre estas, ainda no século XVIII, destaca-se a Gold und Rosenkreutz, a Ordem da Rosa+Cruz de Ouro, uma Ordem de aperfeiçoamento maçônico com ênfase na Alquimia Operativa. O objetivo deste post é fazer conhecer esta Ordem e seu trabalho por uma visão geral, o que poderá servir para comparações com as Ordens Rosacrucianas mais recentes.

A Rosa+Cruz de Ouro de Samuel Richter

Em 1710, ou seja, sete anos antes da criação da Grande Loja de Londres, Sincerus Renatus (Samuel Richter), um pastor luterano de tendência pietista, que se dizia discípulo de Paracelso e Jacob Boehme, publicou “A verdadeira e perfeita preparação da Pedra Filosofal pela Fraternidade da Ordem da Rosa+Cruz de Ouro e da Rosa Vermelha, também chamada Rosa+Cruz de Ouro“. Era um tratado de Alquimia que apresentava práticas de laboratório e dava em apêndice as cinquenta regras que regiam a Ordem da Rosa+Cruz de Ouro. Esse regulamento indicava que a Ordem não devia se compor de mais de sessenta e três Irmãos e que ela era dirigida por um Imperator eleito por toda a vida. Em seu prefácio, Sincerus Renatus afirmava que esse texto não era obra propriamente sua e sim de um “professor da Arte” cuja identidade ele não podia revelar. Declarou que a Ordem possuía dois centros, um em Nurembergue e outro em Ancone, mas que depois de alguns anos seus membros haviam deixado a Europa e seguido para as Índias, a fim de poderem viver mais tranquilamente. 

Esse livro de Sincerus Renatus foi inspirado em Eco da Fraternidade, (…) da Ilustre ordem R.C. (1615) de Julius Sperber, bem como em Témis d’or (1618) de Michael Maier. Retomou também alguns regulamentos da Ordem dos Inseparáveis, uma ordem alquímica fundada em 1577. Na realidade, a ordem descrita por Sincerus Renatus não parece ter existido (historicamente, nem a Fraternidade da Rosa+Cruz do século XVII parece ter existido). Observemos de passagem que ela adotou novamente um nome, o de Rosa+Cruz de Ouro, que Petrus Mormius já usara em 1630 em Arcanos muito secretos de toda a natureza desvelada pelo colégio rosariano. Este último foi o autor de uma lenda, segundo a qual Frédéric Rose, que teria vivido no Dauphiné, teria fundado em 1622 uma sociedade secreta de três membros: a Rosa+Cruz Dourada. Como quer que tenha sido, o termo “Rosa+Cruz Dourada” teve algum sucesso e alguns dos seus regulamentos foram mais tarde encontrados nas instituições do grau maçônico-rosacruz dos Príncipes Cavaleiros Rosacruzes. 

Nesta obra vemos também que o tom anti-papal dos manifestos cessou e que agora a Rosa+Cruz estava sendo retratada como o Caminho Real, assim acrescentando o Ouro à Rosa e à Cruz em alusão ao aumento no enfoque da Alquimia Operativa.

A iniciação nesta época era muito simples e era realizada à noite em uma igreja. O candidato era preparado por seu padrinho durante três meses e então conhecia o seu Iniciador pela primeira vez no altar da igreja. A iniciação era dividia em três partes, a saber: atividades cerimoniais, o juramento e uma oração. Após isto o novo membro recebia, sob regulamentação estrita, uma parte da Pedra Filosofal. Embora o tom seja diferente da Ordem da Rosa+Cruz Dourada que se estabelecera cerca de 50 anos depois, os seus estatutos estabeleceram novos padrões para o tempo ainda por vir.

O Tosão de Ouro 

Nos anos seguintes surgiu uma Ordem Rosa+Cruz de fato. Em 1749, Hermann Fictuld publicou Aureum Vellus, em que evocou uma sociedade dos rosacruzes de ouro, que apresentou como herdeira da Ordem do Tosão de Ouro, fundada por Philippe le Bom em 1492. Por volta de 1757 ele criou um rito maçônico de tendência alquímica e pietista, composto de um conjunto de graus rosacruzes: a Societas Rosae Crucis ou Fraternidade da Rosa+Cruz Dourada. Essa sociedade se propagou por muitas cidades como Frankfurt am Main, Marburg, Kassel, Viena e Praga. Parece que continuou até 1764. Na realidade, foi reformada graças a Schleiss von Löwenfeld e Joseph Wilhelm Schröeder. Finalmente, deu origem a outro rito maçônico rosacruz que surgiu entre 1770 e 1777 na Bavária, na Áustria, na Boêmia e na Hungria. Foi primeiro adotado por uma loja maçônica de Ratisbonne, a Crescente de Três Chaves. Em 1771, foi adotado também por uma loja de Viena, a Esperança, que originou a das Três Espadas. Esta loja se tornou um seminário desse rito maçônico rosacruz que cultivava a Alquimia e a Teurgia.

Os Arquitetos Africanos 

Todavia, essa Ordem teve uma cisão a partir de 1767. Por instigação de Carl Friedrich von Köppen (1734-1797), comissário das guerras a serviço da Prússia, o grupo dos Arquitetos Africanos se separou da Ordem. Uma das características mais espantosas dessa ordem era seu aspecto egípcio, pois por “Arquitetos Africanos” é preciso entender aqui “egípcios” (Rebisse, 2004). 

Esse círculo produziu em 1770 uma brochura que teria muitas repercussões: Crata Repoa ou Iniciações aos antigos mistérios dos sacerdotes do Egito. Segundo esse texto, Crata Repoa designaria um grupo secreto de egípcios fundados por Menés. Os Arquitetos Africanos compunham um conjunto de sete graus. No primeiro, Pastophoris, o adepto era iniciado aos hieróglifos e recebia um boné que terminava em pirâmide e um avental denominado “xylon”. No segundo, Neocoris, ele recebia o caduceu e aprendia a cruzar os braços no peito na atitude de Osíris. No terceiro, Melanephoris, era confrontado com o reino dos mortos e colocado ante o sarcófago de Osíris. No quarto, Christophoris, era iniciado à misteriosa língua “amounica” e, no quinto, Balahate, aprendia Alquimia. Seguia-se o sexto grau, o de Astronomus, em que ele aprendia Astronomia e era conduzido até à porta dos deuses. A hierarquia terminava num sétimo grau, Propheta ou Saphenat Pancah, em que lhe eram explicados todos os mistérios da Ordem. Este rito, mantido por Frederico II, se propagaria fora da Prússia e, em 1773, existiriam lojas do rito dos Arquitetos Africanos em Berlim, na Suíça e na França. Havia inclusive uma versão francesa desse rito em cinco graus: Discípulo dos Egípcios, Iniciado dos Mistérios Egeus, Cosmopolita, Filósofo Cristão e Cavaleiro do Silêncio. Este rito foi introduzido na França por um Elu Cohen de Bordeaux oriundo de Estrasburgo, Frederico Kuhn. Os Arquitetos Africanos tinham lojas em Estrasburgo, em Bordeaux (loja da Estrela Flamejante dos Três Lírios) e em Paris. Mas a Ordem teve uma existência efêmera, pois, em 1775, Köppen, desgosto com as querelas, afastou-se, e o rito foi oficialmente dissolvido em 1781. A Estrela Flamejante dos Três Lírios de Bordeaux foi então absorvida pelo Grande Oriente, mas subsistiu até 1824. Apesar de tudo, os temas veiculados pela Crata Repoa influenciaram os diversos movimentos que, em seguida, reivindicariam filiação egípcia. 

O Ouro, a Rosa e a Cruz

A despeito da cisão, a Rosa+Cruz de Ouro continuou suas atividades e teve nova evolução. A partir de 1776, membros da loja das Três Espadas, Johann Rudolf von Bischoffswerder (1714-1803), oficial prussiano e depois ministro de guerra com a morte de Frederico, e Jean Christophie Wöllner (1732-1800), pastor, instauraram uma nova ordem maçônica rosacruz: a Ordem da Rosa+Cruz de Ouro do Antigo Sistema. A Loja dos Três Globos de Berlim tornou-se o centro de suas atividades. Essa ordem adotou um sistema de nove graus: Juniores, Theoretici, Philosophi, Minores, Majores, Adepti Exempti, Magistri e Magi, cujos aspectos simbólicos foram apresentados nos textos da Reforma adotados por ocasião da Convenção que a Ordem realizou em Praga em 1777. De todo o modo, para alguns a GuR+C manifestou-se (ou reviveu) no sul da Alemanha bem antes deste acontecimento, provavelmente entre 1756 e 1758, e rapidamente se espalhou por todo o país, chegando eventualmente a outros países como  Polônia, Suécia e Rússia.

Foi nesse movimento, onde se misturavam Alquimia, Rosacrucianismo e Franco-Maçonaria, que nasceu o célebre livro Símbolos Secretos dos Rosacruzes do Século XVI e XVII (Altona, 1785 e 1788). Composto essencialmente de tratados alquímicos magnificamente ilustrados, ele é com frequência apresentado como um livro rosacruciano de importância similar aos Manifestos. 

A princípio não era necessário ser maçom ou cristão e a Ordem enfatizava uma conexão com os Templários. Em 1767 uma reforma geral ocorreu, a Ordem foi amplamente desenvolvida e sua estrutura ampliada, deixando de ter 7 e agora passando a ter 9 graus, com maior ênfase nos ensinamentos bíblicos. Dentro de alguns anos tornou-se um sistema maçônico de aperfeiçoamento, época esta em que era descrita como uma Maçonaria Teosófica[1]No sentido clássico da Teosofia, já que a Teosofia de Blavatsky viria a surgir mais de 100 anos à frente. Dez anos mais tarde, em 1777, outra reforma ocorreu e são os materiais provenientes deste período que conseguimos ter acesso.

Para o ingresso nesta Ordem, o candidato precisava ter pelo menos 30 anos de idade, ser um verdadeiro Mestre da Luz e da Palavra Perdida (ou seja, ser Mestre Maçom) e possuir sinais visíveis disto (ter honra, senso comum, tranqüilidade, apreciar o conhecimento e a sabedoria, etc). No ingresso, o nome comum era “cabalizado”. Poderia haver modificações de seu nome mundano ou até mesmo a utilização de um pequeno moto.

O objetivo da Ordem era regenerar o homem à sua dignidade original, com a ajuda de Jesus Cristo lutar contra o diabo e a escuridão enquanto se construía um Reino de Luz para que tudo pudesse enfim se reintegrar à condição original. Em suma, magia, alquimia e profecia estarão presentes no seu sistema de graus. É importante entender que há bastante influência da Teosofia, acreditando-se, por exemplo, que as doenças e a morte são resultados naturais do Pecado Original e da subsequente Queda do Homem. A Alquimia é então um caminho para remover o Pecado pela cura das doenças e o prolongamento da vida, efetuada através do desenvolvimento do corpo, da alma e do espírito. Só então que a verdadeira Magia e Teurgia seriam trabalhadas.

Rituais

Os rituais iniciáticos sofrem influência dos rituais da Maçonaria Azul (os três primeiros graus maçônicos) e muitas vezes tenta explicar os significados e simbolismos alquímicos ali escondidos. Cada grau tinha um templo particular, ou seja, a Loja tinha vários templos decorados e coloridos de acordo com os estágios alquímicos. Durante uma iniciação um irmão poderia visitar vários destes espaços a fim de receber instruções específicas daquele grau necessárias durante a iniciação e só então iria para o templo particular do grau em que seria recebido, tudo isto feito de forma ritualística com perguntas, palavras de passe e sinais.

Além das iniciações, havia cerimônias de instrução, com discursos sobre Maçonaria, Alquimia, Teosofia e Cabala Cristã. Também havia Lojas de Mesa, nas quais o objeto mais importante era um saleiro cercado por três velas. O catecismo dos graus eram sempre recitados em tais encontros.

Graus

Qualquer semelhança da nomenclatura dos graus da GuR+C com o de algumas Ordens Rosacrucianas Modernas não é mera coincidência… Sim, dela que surgiu os nomes que virão a ser utilizados na SRIA, Golden Dawn e etc. Vejamos o que era estudado em cada um deles. Estamos aqui usando a estrutura de 9 graus original, mas posteriormente, numa outra reforma da Ordem, a estrutura tornou-se de 10 graus – novamente, a mesma estrutura das Ordens contemporâneas a nós.

Antes de começarmos a analisar grau por grau, vale ressaltar que, como indica René Le Forestier, os ensinamentos dos Juniores reproduziam cento e dez páginas do Opus magocabbalisticum et theosophicum (1719) de George von Welling (livro com o qual Goethe logo se iniciaria ao pensamento rosacruz). A instrução e o ritual dos Theoretici retomavam o Novum laboratorium medico-chymicum de Christoph Glaser (1677). Quanto às operações alquímicas ensinadas aos Magistri, tinham sido tiradas de dois livros de Heinrich Khunrath: a Confessio de Chao Physico-chemicorum catholico (1596) e o Amphiteatrum sapinetiae aeternae (1609). Os rituais e os ensinamentos dessa ordem estavam então claramente orientados para a Alquimia. 

  1. Juniors

Grau teórico onde se aprendia a origem da Fraternidade e que via os três graus da Maçonaria Azul como uma escola preliminar para as mais elevadas ciências, dando interpretações alquímicas a eles. Cada grau ganhava a interpretação de um dos estágios alquímicos. Também se deveria aprender várias páginas de símbolos alquímicos e seus significados alquímicos e cabalísticos, bem como a sua cifra obrigatória, os quais seriam colocados em uso a partir do quarto grau.

  1. Theoreciti

Grau teórico que possui o lema “através da observação da natureza podemos conhecer a Deus e a nós mesmos”. O Gênesis era interpretado alquimicamente e era estudado uma doutrina geral da criação de todos os seres, bem como suas relações com o macro e o microcosmo. O Aurea Catena Homeri, de Anton Kirchweger, e os trabalhos de Arnaldus de Villa Nova eram estudados e também apresentados durante a iniciação.

  1. Practici

Deveria aqui se entender corretamente os Três Reinos da Natureza e seus Regentes, as Concordâncias dos Filosófos, bem como suas Manipulações, Fornos e Recipientes. Aqui então o verdadeiro laboratório alquímico começava, onde se aprendia o que um laboratório deveria ter e como preparar os Radical e Universal Menstrua de cada um dos Reinos. As receitas alquímicas de “Como fazer, na Via Úmida, as Preparações das Pedras Mineral, Vegetal, Animal e Universal” eram utilizadas. As 7 operações na Via Úmida também eram dadas e trabalhadas neste grau. A obra prima de Welling intitulada “Opus Mago-Cabbalisticum et Theosophicum” era leitura obrigatória a partir daqui.

  1. Philosophi

Aqui se continua o trabalho no laboratório alquímico, onde se aprende a verdadeira imagem dos Reinos Filosófico, Animal, Vegetal e Mineral. As receitas alquímicas incluíam “Preparação do Radical Menstrua”, “Preparação do Lapis Mineralis de acordo com a Via Úmida”, “Calcinatio e Putrefactio do Ouro”, “Resolutio e Coagulatio do Ouro” e “Como construir uma vela que sempre queima”. Referências bíblicas eram utilizadas para demonstrar a importância dos números 4 e 40, que foram considerados como de grande importância no trabalho alquímico, os quais seriam utilizados nas operações dos graus mais altos.

  1. Minores

Cabala Cristã, a qual era estudada com ênfase nas relações com a Alquimia. As operações alquímicas (10 no total) eram centradas nos mistérios do Sol e da Terra filosóficos, como se preparar o VITRIOL para o trabalho mineral e como fazer tinturas de cura. A partir daqui, os membros não trabalham juntos com membros de graus mais baixos nas operações alquímicas, com exceção dos momentos de instrução deles. Um livro importante estudado neste grau é o Kabbala Denudata de Knorr Von Rosenroth. Perceba que, ao contrário das ordens contemporâneas, primeiro trabalha-se a Alquimia para mais na frente se trabalhar a Cabala e mesmo a Teurgia. Ainda que haja um enfoque em Alquimia Laboratorial nesses primeiros graus, a sua correlação com a Alquimia Interior também seria objeto de estudo. Antes de “falar com os anjos” e “mudar o mundo à sua volta”, trabalhe-se!

  1. Majores

O trabalho alquímico focava na preparação do Sal Filosófico e como coagular a Pedra a partir do fleuma. Aprendia-se a como usar o estômago como Athanor. Certas restrições alimentares aqui também seriam vistas. A Via Seca é mais trabalhada aqui, com ênfase na construção da Pedra Mineral. Um importante estudo era “Schlüssel der WahrenWeisheit” e “Der Compass der Weisen”.

  1. Adepti Exempti

O trabalho alquímico focava no orvalho da manhã, a preparação do Leão Vermelho, como produzir as pedras dos quatro reinos e a muito famosa Pedra Filosofal. A operação foi baseada no tratado da Splendor Solis numa resumida versão sueca da Arcana Arcanorum. Assim, o Aureum Vellus se torna um importante estudo. Magia (magia naturalis) é encontrada e trabalhada aqui pela primeira vez.

  1. Magistri

O trabalho mágico é aqui ainda mais elaborado, onde se estuda e trabalha com a Opus Astrale Universalissimum – em resumo, como o Espírito Universal influencia a Terra através do Sol, da Lua e dos planetas visíveis, e como estes refletem-se no interior do homem através de fluxos e refluxos, de ciclos. Resumindo, o trabalho consiste na Magia denominada Salomônica e o trabalho alquímico é focado no Elixir da Vida. Um enfoque mais hermético na Astrologia é dado também, assim sendo.

  1. Magi

O supra-sumo do sistema era o Urim & Turim (que nada tem haver com o bíblico, sendo um preparado alquímico com fins de profecia), o Schemhamphorash e o trabalho teúrgico que era aqui chamado de Magia Divina.

Schemhamphoras

O sistema Schemhamphoras baseava-se no livro “Semiphoras e Schemhamphoras”, publicado em 1686. É um tratado de Magia Salomônica, onde se aprende a contactar e comunicar-se com o Divino e seus agentes da mesma forma que Moisés e Salomão fazia. Aos membros era atribuído um anjo pessoal, com o qual eles estabeleciam contato. Tais operações necessitavam de um círculo mágico específico traçado no chão, de acordo com a natureza do seu anjo pessoal ou do anjo que se queria questionar ou dar instruções para (os 10 círculos diferentes relacionavam-se com as 10 Sephiroth). Uma longa série de purificações e orações logo antes da conjuração real poderia ocorrer. A conjuração poderia ser feito por três diferentes caminhos, a saber, 1° se o ser era para aparecer em sonhos, 2° se o ser era para aparecer quando estiver acordado no meio da noite, e 3° se o ser era para aparecer imediatamente em sua forma física diante do círculo. Em geral, o trabalho é bastante semelhante às operações do sistema francês Elus Cohen de Pasqually, embora um pouco “mais fácil” de compreender (ainda que esse trabalho só viria no último grau do sistema da GuR+C, que exigia, assim como nos Elus Cohen, um longo trabalho até chegar até ele).

Magia Divina

No nono grau, os membros recebiam um manuscrito chamado Magia Divina, que hoje é amplamente conhecido como a operação de Abramelin. Eles descreve seis longos meses de trabalho teúrgico destinados a alcançar um contato e conversação com o seu Sagrado Anjo Guardião. Depois de este contato ser estabelecido, evoca-se uma legião de espíritos demoníacos e todos eles têm que se submeter à vontade do mago, que atua no mais elevado serviço de Deus. Tendo sido originalmente composto por um judeu chamado Abraham Von Worms, o primeiro capítulo descreve como o sistema foi ensinado a ele por seu mestre Abramelin, daí o nome. Na Rosa+Cruz Dourada, no entanto, sendo uma Ordem cristã, este capítulo foi removido, e o documento, portanto, continha apenas dois capítulos com instruções e quadrados mágicos. Além disso, várias das implicações morais que se encontram nas versões publicadas estão completamente ausentes nas instruções, especialmente as que tratam da moral e costumes judaicos, que, em alguns casos, são reconfigurados num tom mais cristão. E, seja surpresa ou não, todos os quadrados mágicos são diferentes; eles normalmente têm os mesmos títulos e descrições, mas além de algumas ocasiões, não têm qualquer semelhança com os que estão publicados. Foram adicionados também alguns desenhos muito bonitos e detalhados do santuário, do altar e da vestimenta ritualística usada.

Urim e Thumin

O maior dos segredos foi o lendário Urim & Thumi, que foi descrito como “o conhecimento da Luz trina sobrenatural, através do qual se pode investigar a origem, o passado, o presente e o futuro de tudo o que existe”. Na verdade este trabalho era uma combinação de Alquimia e Teurgia, que produzia uma pedra de scrying consagrada aos sete Grandes Vigias. Para construir o Urim & Thumin, era preciso purificar cada um dos sete metais em seus específicos dia e hora e misturá-los com certos ingredientes. Na lua nova seguinte, os sete metais eram fundidos e lançados num formulário específico, sobre o qual estavam inscritos certos caracteres mágicos, novamente de acordo com as horas planetárias. Em seguida, na sexta-feira seguinte, dois cristais pequenos e cinco grandes eram triturados e fechados com ouro. Na próxima vez que o Sol entrar em Leo, coloca-se as quatro Pedras no Fogo e se faz uma Pedra do Sábio que nunca brilha. Esta era colocada no cristal maior; Para usá-lo, era preciso uma câmara limpa e isolada (onde ninguém havia comido ou bebido), no qual eram colocadas sete cadeiras em torno de uma mesa central. Cada uma das cadeiras era marcada com os caracteres de seu respectivo planeta. O Urim era então levado para fora de seu recipiente e posto sobre a mesa, ao lado de duas velas acesas. Seguem-se então meditações, incensos, orações e salmos, até que os sete membros mais antigos sentavam-se nas cadeiras. Se mais de sete membros estavam presentes, os restantes tinham que ficar por trás das cadeiras e apenas observar a cerimônia. Os sete anciãos meditavam em silencio e então olhavam para o Thumin. Em seguida eles viam, em grande humildade, o que eles desejavam ver, saber ou entender – se envolvia o macrocosmo ou o microcosmo, anjos, vivos ou mortos, situações no passado, presente ou futuro – o que resultava em uma luz incandescente entre os seus rostos e o Thumin. Durante e após a cerimônia, eles eram apenas autorizados a discutir as experiências que eram relacionadas à Ordem e seus membros. A cerimônia termina com orações, reposição do Urim & Thumin, extinção das chamas das velas e então todos saíam da câmara.

Igreja Rosacruz

Na Suécia existia uma igreja Rosacruz secreta chamada Theosophia Apostolica Rosae Crucae. Este sistema teosófico Rosacruz era aberto a alguns membros eleitos de alto grau da Rosa+Cruz de Ouro, e consistia em três ordenações – Sacerdote, Bispo e Patriarca – que também eram chamados de “Verdadeira Iniciação”. Parece que apenas existiu na Suécia e foi criado por pessoas aderentes às ideias do místico sueco Emanuel Swedenborg (1688-1772). A finalidade das três ordenações era trazer o candidato a um mais consciente e regular contato com seu Sagrado Anjo Guardião e alinhar-se com o anjo específico da tradição e, assim, tornar-se um verdadeiro Profeta, vendo e conhecendo os caminhos do Senhor, utilizando-se para isto de selos mágicos. A litania utilizada nas ordenações vem de um manual sueco de igreja (protestante) de 1693, mas a sua profissão de fé é única e é provavelmente inspirada no L’Église Constitutionelle francês. Um dialeto do aramaico ocidental é utilizado nas ordenações, o mesmo dialeto utilizado nas Igrejas Patriarcas Siríacas de Antioquia.

Concluindo…

A Ordem Maçônica da Rosa+Cruz de Ouro do Antigo Sistema tinha uma característica que a diferenciava do Rosacrucianismo do século XVII: reinvidicava filiação que remontava a Ormus, ou Ormissus, um sacerdote egípcio batizado por São Marcos. Ormus teria cristianizado os mistérios do Egito e teria fundado a ordem dos Ormusianos, dotando-a como símbolo de uma cruz de ouro esmaltada de vermelho. Em 151, os essênios teriam se unido a eles e essa ordem teria adotado o nome de Guardiões do Segredo de Moisés, Salomão e Hermes

Após o século IV, a Ordem nunca teve mais de sete membros. No século XII, admitiu templários e, quando os cristãos perderam a Palestina em 118, os membros da Ordem se dispersaram no mundo. Três deles teriam ido se instalar na Europa e teriam fundado a Ordem dos Construtores do Oriente. Raymond Lulle teria sido admitido nessa Ordem em que logo iniciou Eduardo I. Em seguida, somente os membros da casa de York e de Lancaster foram dignatários da Ordem; por isso foi acrescentada à cruz de ouro, usada como símbolo da Ordem, a rosa que constava nos brasões das duas famílias. 

Assim teria nascido a Ordem Maçônica da Rosa+Cruz de Ouro. Esta é uma Ordem Rosacruciana tradicional que promovia o trabalho alquímico para a realização de uma verdadeira Magia Divina. Qualquer que fosse sua filiação mítica, essa ordem que nascera na Alemanha no século XVIII desenvolveu-se essencialmente na esteira da Estrita Observância Templária, que era então o rito maçônico mais importante na Alemanha. Cabe enfatizar que, se até então o Rosacrucianismo só dera origem a pequenos grupos de que não se descobriu nenhum ritual até hoje, a Ordem Maçônica da Rosa+Cruz de Ouro do Antigo Sistema deixou numerosos documentos atestando sua atividade, os quais foram utilizados como base de diversas outras ordens rosacrucianas modernas. Ela teve, além disso, uma grande difusão na Europa central e muitas personalidades, como o príncipe Frédéric-Guillaume ou Nicolai Novikov na Rússia, foram seus membros.

No entanto, nada que é bom dura para sempre. A cada dez anos deveria ocorrer uma reforma obrigatória e, através destas reformas, a Ordem foi desaparecendo devido a conflitos internos, experiências alquímicas com resultados fatais, Superiores Incógnitos que deixaram de passar os ensinamentos mais secretos aos membros desta Fraternidade e conflitos externos com outras Ordens da época. Foi posta em inatividade, então, em 1787, após ter dado origem aos Irmãos Asiáticos (1779), de que Charles de Hesse-Kassel foi o Grande Mestre. É sem dúvida nesse movimento que cabe situar o enigmático conde de Saint-Germain. Com efeito, a partir de 1778, ele se instalou junto a Charles de Hesse-Kassel, que se tornou seu discípulo e protetor. Os Irmãos Asiáticos continuaram perpetuando o sistema dos Rosa+Cruzes de Ouro, com uma ênfase maior na Cabala do que na Alquimia e, ao contrário da Rosa+Cruz de Ouro, aceitando tanto cristãos quanto judeus, ao invés de somente cristãos. Ao lado da série de acidentes em laboratório que colocava em risco os participantes, os judeus não poderiam ingressar na GuR+C. Já nos Irmãos Iniciados da Ásia, judeus e cristãos poderiam ingressar, sendo que os judeus teriam um nome iniciático cristão e os cristãos um nome iniciático judaico. De todo o modo, o sistema dos Irmãos Asiáticos já não era o mesmo dos Rosa+Cruzes de Ouro, embora evoca a lenda dos Irmãos de Constantinopla que uniram os conhecimentos do Ocidente com o do Oriente através dos Cavaleiros Templários no século XX. 

De todo modo, os ensinamentos e sistema desta Ordem continua a influenciar outros grupos até hoje.

No nosso Priorado, perpetuamos a GuR+C dentro do Sistema INRI e do Rito da Fênix.

Referências

Referências
1 No sentido clássico da Teosofia, já que a Teosofia de Blavatsky viria a surgir mais de 100 anos à frente

Comentários

2 respostas para “GuR+C, a Rosa+Cruz Dourada”

  1. Ricardo Lins

    Excelente artigo! Muito conhecimento histórico!

  2. Altamente elucidativo!
    Muito grato pelo artigo!

Deixe uma resposta