“Permaneceremos desconhecidos no mundo para que nossas obras sejam duradouras e perenes”. (Louis-Claude de Saint-Martin)
Este presente estudo visa a abordar a história dos chamados “Filósofos Desconhecidos”. Existem pouquíssimas informações sobre este tema e, nessas poucas, há várias interpretações equivocadas, gerando mesmo problematizações dentro de várias escolas iniciáticas que seguem a escola francesa do Esoterismo Ocidental.
O esquema abaixo foi montado a partir de uma série de organogramas que tentam explicar as filiações das diferente Ordens que compõem a Tradição Esotérica Ocidental de um ponto de vista iniciático, de acordo com a obra de Robert Ambelain “O Martinismo, História e Doutrina”, por um S::: I::: da “Sociedade dos Filósofos Desconhecidos”, no Chile. Traduzimo-nos abaixo, com uma ligeira adaptação. Tenha em mente que este esquema não possui o objetivo de demonstrar o que historicamente de fato ocorreu, mas de demonstrar simbolicamente as principais influências que esses Filósofos Desconhecidos beberam.
Com uma rápida interpretação destes esquemas, podemos perceber que a filosofia de Louis-Claude de Saint-Martin não foi a única corrente que influenciou a “Ordem Martinista” constituída por Papus, sendo essa mesma corrente influenciada por diversas outras. Percebemos também que o próprio Saint-Martin é o exemplo mais recente de uma doutrina iniciática muito mais antiga que ele.
Em sua obra “O Crocodilo, ou a Guerra do Bem e do Mal” encontramos uma personagem chamada Senhora Jof. Ela é, simbolicamente, o Martinismo enquanto corpo doutrinário ligado a uma “Sociedade dos Independentes” (SI), que na realidade era um dos nomes da “Sociedade dos Íntimos” (SI) e mesmo dos “Superiores Incógnitos” (SI). Os cantos 14 e 15 desta obra tratam da personagem e da Sociedade e aqui destacamos estes trechos abaixo:
“Como vivia em todos os lugares, também havia em todos os lugares a sua Sociedade dos Independentes, que certamente havia sido chamada de Sociedade dos Solitários, pois que cada homem tem em si mesmo esta Sociedade (…). Como esta Sociedade distinguia-se de todas as Sociedades conhecidas, inclusive não sendo uma sociedade, não devemos considerar a palavra reunir no sentido que é comumente entendida. Assim, embora eu apresente a Senhora Jof reunindo os vários membros da Sociedade dos Independentes, não é menos verdade que eles não se encontraram; que esta presumida assembleia foi realizada em cada um dos membros isoladamente, no espaço onde se encontrava, sem estar sujeita a nenhum local, nenhuma cerimônia nem a limite algum; que cada um dos membros tinha o privilégio de ver todos os outros membros no lugar onde estavam e também de ser percebido por cada um deles… todos tinham o privilégio de estar na presença da Senhora Jof e ela tinha o privilégio de estar na presença de todos eles, quando quisesse, qualquer que fosse a distância ou a variedade de locais em que viviam”.
Gregory Ottonovich von Mebes (S:::I:::), Mestre contemporâneo da filiação Russa do Martinismo, conta-nos, em sua obra-prima “Os Arcanos Maiores do Tarot”, que entre o final do século XV e o início do século XVI, a transformação do Rosacrucianismo primitivo, com uma clara filiação Templária, ocorreu no chamado Rosacrucianismo secundário. Durante esse período, várias fraternidades e ordens esotéricas foram formadas ou “despertadas do seu sonho”. Dessa época, data a constituição da “Sociedade dos Filósofos Desconhecidos”, a partir de uma filiação direta dos “Irmãos Bizantinos do Oriente”. Como observamos no esquema apresentado, não é de se estranhar que para a formação da “Sociedade dos Filósofos Desconhecidos” houve fontes oriundas de Gnósticos, Templários, Alquimistas, Hermetistas, Rosacruzes e Cabalistas.
O beneditino Dom Pernety em seu “Dictionnaire Mytho-Hermetique” dá a seguinte definição para o verbete Filósofo: “Amante da sabedoria, que é instruído nas operações secretas da natureza, e imita seus procedimentos para eventualmente produzir coisas mais perfeitas do que a própria natureza. O nome de Filósofo foi dado em todos os momentos para aqueles que são verdadeiramente instruídos nos processos da Grande Obra, a que também se chama Ciência e Filosofia Hermética, pois se considera Hermes Trismegisto como o primeiro que nela se destacou. Pretendem que somente eles merecem, justamente, esse respeitável nome, pois orgulham-se de ser os únicos que conhecem a natureza a fundo, e através deste conhecimento, alcançam o Criador, ao qual rendem suas homenagens, com muita atenção, amor e respeito. Dizem que o amor é o primeiro passo que leva à sabedoria, constantemente recomendando-o a seus discípulos, que são chamados Filhos de ciência”. Sendo assim, a palavra Filósofo não se refere aos graduados em qualquer universidade de Filosofia, mas se refere ao sentido medieval do termo, os “Filósofos do Fogo”, ou seja, os Alquimistas.
Pseudo Alberto, o Grande, no início de seu tratado “De Alchemie”, recomenda que os Alquimistas devem viver longe dos homens, serem silenciosos e discretos, não revelar a ninguém os resultados de suas operações, que vivam na solidão, evitem contato com os príncipes e governantes deste mundo e que sua obra seja feita sem barulho. Resumindo de uma outra forma alguns de seus pontos, era preciso que o Alquimista desejasse fazer o bem, mas sem fazer barulho, pois “o barulho não faz bem e o bem não faz barulho”, como diria Louis-Claude de Saint-Martin.
Em um capítulo do livro “El Martinismo Tradicional”, de J. F. Ferro, encontramos mais pistas sobre a origem dos Filósofos Desconhecidos. “Embora seja tradicionalmente dito que a ‘Societé des Philosphes Inconnus’ foi reorganizada na França em 1643, já em 1625 circulou na Europa um panfleto intitulado ‘Um Tratado Áureo sobre a Pedra Filosofal’ cujo autor assinou como um ‘Filósofo Desconhecido, ainda vivo, para ensinar filiis doctrinae e conhecimento dos ‘Fratibus Aureae-Crucis’ ”. Assim se demonstra que o nome dos Filósofos Desconhecidos já era utilizado antes de 1643.
Há numerosos testemunhos impressos que ilustram a existência e as atividades dos Filósofos Incógnitos durante os séculos XVII e XVIII.
Em 1646, o abade de Notre-Dame-de-la Chapelle e Bispo de Bellay (França) Hermona dom Jean-Albert Belin, publicou seu livro “Les Aventures du Philosophe Inconnu em la Recherche et L’Invention de la Pierre Philosophale” editado em Paris por E. Danguy. O termo Filósofo Desconhecido é apresentado nos títulos e resumos da obra, mas não aparecem no texto, onde se encontra o que se entendia habitualmente por Filósofo.
Em 1673, o alquimista anônimo que estava oculto sob o pseudônimo de “Atremont” publicou o livro “Le Tombeau de la pauvreté dans lequel il est traité clairement de la transmutation des metaux et du moyen derramar qu’on tenir doit e parvenir. Par un Philosophe Inconnu en faveur de ses amies particuliers”. É curioso citar que a dedicatória da obra é assinada por “N. N. Patrão Geral da Sociedade dos Filósofos Errantes”.
Em 1691, foi publicado em Paris o trabalho de Alexander Sethon “Cosmopolita” entitulado “Traités du Cosmopolite Nouvellement découverts. Ou après avoir donné una idée d’une Societá de Philosophes, on explique dans plusiers Lettres de cet Auteur la Théorie et la Práctique des Verités Hermétiques, en la cual se dan a conocer los Statuts des Philosophes Inconnus”. Da página 3 a 9 da obra, encontramos a ideia de uma nova sociedade de filósofos. Mais à frente, das páginas 10 a 40, aparecem os “Estatutos dos Filósofos Desconhecidos”. A seguir, da página 41 a 224, encontramos as “Cartas de Michel Sendigovius, ou de J. J. D. I., comumente chamado de Cosmopolita”. A primeira das 53 cartas é dirigida ao Senhor T., “novo sócio da Companhia dos Filósofos Desconhecidos”. O volume termina por um resumo do livro e fecha com um carimbo ou hieróglifo da “Sociedade dos Filósofos Desconhecidos”.
A próxima referência é encontrada na “Biblioteca dos Alquimistas ou Filósofos Herméticos, contendo várias obras deste gênero muito curiosas e úteis que ainda não apareceram”, publicada em Paris, em 1754, onde há um “Tratado de um Filósofo Desconhecido sobre a Obra Hermética, revisto e elucidado pelo discípulo Sophise sob os auspícios das Cohermeites, Philovites e Chrisophiles”, onde, como de costume, as palavras “Filósofo Desconhecido” não se encontram novamente no texto. O inverso ocorre algumas páginas adiante da mesma “Biblioteca”, a “Carta Filosófica de Philovite para Heliodore”, onde encontramos indicações do texto de origem, “Um filósofo desconhecido, sem dúvida das fênix errantes…, ele dirigiu… a um de seus amigos…”.
Em 1763, aparece o “Traité d’un Philosophe Inconnu sur l’Oeuvre Hermétique. Revue et elucidée par le disciple Sophisée sous les auspices (sic) des Cohernistes Philovites et Crisophilos”.
Em 1788, no primeiro volume do “Geheime Figuren aus den dem Rosenkreuzer 16ten. und 17ten. Jahrhundert” [1]uma de suas diversas versões foi publicada no Brasil pela “Ordem Rosacruz, AMORC” sob o título de “Símbolos Secretos do Rosacruzes dos Séculos XVII e XVIII”, publicado em Altona, aparece um Discurso de um Filósofo Desconhecido (Unbekannten Philosopho) dedicado à Sociedade R + C”.
Em 1766, o livro “L’Etoile Flamboyante” de Baron Tschoudy onde aparece os “Statuts des Philosophes Inconnus” e longas referências à Sociedade dos Filósofos Desconhecidos e seus ensinamentos é publicado em Paris[2]É relevante lembrar que “L’Ordre de l’Etoile Flamboyante” (“Ordem da Estrela Flamígera”) do Barão Tschoudy deu origem ao rito maçônico Adonhiramita.. No segundo volume, temos a “Ideia Geral da Maçonaria, considerada sob um ponto de vista filosófico e que já nomeou vários antigos sob o nome da Sociedade dos Filósofos Desconhecidos”, os Estatutos dos Filósofos Desconhecido e os Catecismos para o grau de Adepto ou Aprendiz Filósofo Sublime e Desconhecido, assim como a folha intitulada “Quadro dos Aprendizes Filósofos Desconhecidos”.
Em 1790, o alquimista e Irmão Duchanteau publicou o livro “Le Grand Livre de la Nature ou l’Apocalypse Philosophique et hermétique”, onde sua capa deixa claro que o trabalho foi “revisado por uma Sociedade de Filósofos Desconhecidos” e que o seu conteúdo se refere à Filosofia Oculta e à Sociedade da Rosa + Cruz”.
Além da filiação dos “Irmãos do Oriente”, a “Sociedade dos Filósofos Desconhecidos” é depositária tradicional de filiações iniciáticas muito antigas do Ocidente. De fato, junto com sua investidura de cavalaria e rosacruz, ela recebeu os segredos da misteriosa irmandade de A.G.L.A. [3]esta sigla misteriosa recebeu as seguintes interpretações: ‘Atha Gadol Leholam Amem’ e ‘Ateh Gibor Leholam Adonai’, podendo significar desta forma “Oh Senhor, Tu és Todo-Poderoso … Continue reading, onde foi iniciado o Rei Francisco I da França, que, uma vez por mês e de forma oculta, deixava o palácio do Louvre e dirigia-se, sozinho e envolto em seu manto, à Rua da Árvore Seca em Paris, onde a morada dos irmãos Etienne se encontrava, membros jurados da Sociedade. A irmandade de A.G.L.A. reunia os Aprendizes, Companheiros e Mestres do Livro que, com a propagação de impressão e a organização do comércio de trabalhadores, uniu-se a impressores, tipógrafos, encadernadores, livreiros, papeleiros, iluminadores, artesanatos de cartas e naipes de Tarô, etc.
Durante o século XVIII, a atividade da “Sociedade dos Filósofos Desconhecidos” era intensa e semi-pública em toda a Europa. Grandes personalidades decoravam suas fileiras: o príncipe Christian von Hesse, príncipe Alexis Borisowitz Galitzin, os hermetistas Duchanteau e seu discípulo conde Saxonius Comneno, testemunhavam a aliança multissecular existente entre a “Sociedade dos Filósofos Desconhecidos” e a Dinastia Comnena.
Frederik-Gottlieb-Efraim-Wiesse, sob o pseudônimo de “Magister Piancó”, publicou o livro “Der Rosenkreutzer in seiner Blosse” (Amsterdã, 1781), no qual ele se referiu a uma irmandade de estudiosos a quem chamou de “Superiores Incógnitos” (Unbekannten Obere) que se organizaram em pequenos círculos (Ringe). De acordo com Wiesse, “quem quer ser iniciado e admitido em seus segredos deve ser um homem de honra e um verdadeiro líder espiritual. Além disso, você deve possuir um conhecimento considerável, pois só se aceitará aqueles de quem você pode esperar um excelente serviço para a Santa Irmandade”. Em seguida, ele acrescentou que “os Iniciados usam o duplo triângulo, símbolo das três qualidades de Poder, Sabedoria e Amor. Os Mestres do segundo grau ou Segundo Secreto são mestres no conhecimento da Natureza, as suas forças e seus reinos. São chamados Filósofos ou Sábios do Mundo e sua ciência é a Sabedoria Universal (a Sabedoria Universal aludida era a Pansofia, a quem se referiam os Rosa+Cruzes em seus manuscritos). Esses sábios se ocupam sobre suas coisas em segredo. Ninguém sabe onde eles se encontram e o que fazem. Possuem uma ciência secreta que é conhecida apenas entre os mais avançados entre eles que são chamados de Magos ou Sábios Mestres, os quais ensinavam ao povo as artes divinas. Podem fazer coisas que parecem sobrenaturais”.
Na França, quando a “Sociedade dos Filósofos Desconhecidos” manifestou-se no século XVII, despertou a resistência de certos setores da Igreja Católica impregnados do nascente espírito moderno e racionalista para quem as doutrinas tradicionais e esotéricas já estavam mal interpretadas e, portanto, tornou-se suspeita. Seria necessário esperar até o próximo século para o “Philosophe Inconnu” nascer.
Em terras germânicas, as atividades esotéricas da “Sociedade dos Filósofos Desconhecidos” eram especialmente dedicadas à Alquimia, produzindo um grande florescimento de espíritos escolhidos entre os séculos XVI e XVIII. Entre outros grandes iniciados especialmente destacados: Heinrich Khunrath, Jacob Boehme, Georg Gichtel e Rudolf von Salzmann, sendo este que iniciou pessoalmente Johan W. von Goethe e o marquês Louis-Claude de Saint-Martin.
Segundo a tradição, Louis-Claude de Saint-Martin recebeu sua primeira iniciação na “Sociedade dos Filósofos Desconhecidos” durante sua viagem a Londres em 1787. No ano seguinte, recebeu um novo grau em Estrasburgo pelas mãos do Irmão Rudolf von Salzmann, S::I:::, “sous la Masque, le Manteau et la Cordeliere”[4]Sob a máscara, o manto e o cordão.. Em 1793 ele recebeu uma iniciação complementar e a missão de perpetuar a cadeia multissecular de Superiores Desconhecidos, do mesmo modo como havia sido estabelecido na França no século XV. É interessante notar que em sua obra ”Dos Erros e da Verdade” ele não se define como ”O Filósofo Desconhecido”, mas como ”UM Filósofo Desconhecido”.
Em meados do século XVIII, o interesse na “Sociedade dos Filósofos Desconhecidos” foi definhando e ela em si havia quase desistido da prática da Alquimia Metálica para se dedicar à Alquimia Teosófica sob a influência das doutrinas de Khunrath e Boehme. À Sociedade, não eram estranhas as letras “S:::I:::”, às quais acrescentaram o uso de seis pontos dispostos ao longo das linhas do Crisma ou do Selo de Salomão; esse uso veio diretamente dos extintos Irmãos do Oriente. Deve ser salientado que esse é um antigo simbolismo mencionado no Antigo Testamento por causa da serpente de bronze levantada por Moisés no deserto como um prenúncio de Cristo, pois em sua forma de monografia, as letras “S” e “I” fazem o ideograma da Serpente de Bronze Crucificada. São Bernardo de Clairvaux, entre outros, vai retomar o símbolo da Serpente de Bronze como um emblema específico de Cristo. Por outro lado, a letra “S” simboliza a multiplicidade e a letra “I” simboliza a unidade. Por fim, dizemos que a consagração com os Filósofos Desconhecidos sob o símbolo da “Máscara”, do “Manto” e do “Cordão” são de propriedade distintiva dos antigos Filósofos Desconhecidos.
Por mais que a parceria entre Maçonaria e Alquimia possa parecer algo moderno, na realidade a Alquimia é uma das chaves da Maçonaria Moderna estabelecida em Londres, no século XVIII. Através de Tschoudy, a Alquimia vai penetrar as Lojas que estão se adaptando ao novo sistema popularizado pela Grande Loja Unida da Inglaterra, bem como as suas alusões aos Filósofos Desconhecidos. Esses famosos e lendários Superiores Incógnitos, aliados aos não menos famosos segredos maçônicos, começaram a dar origem ao florescimento dos Altos Graus e numerosos ritos e regimes, seja diretamente ou através dos mitos de criação destes ritos e graus. Assim, pelo menos a palavra “Filósofo” começou a aparecer nos Altos Graus. Foi com estas bases que, em 1790, o pintor Touzay publicou “O Grande Livro da Natureza ou o Apocalipse Hermético, obra curiosa que trata da Filosofia Oculta, da inteligência dos Hieróglifos, dos antigos, da Sociedade dos Irmãos da Rosa+ Cruz da transmutação dos metais e comunicação do homem com Seres Superiores e Intermediários entre ele e o Grande Arquiteto. Visto por uma Sociedade de Fil… Desc… e publicado pelo D … desde o I, até o ano de 1790” [5]republicado pela Librairie du merveilleux, em 1916 com uma introdução por Oswald Wirth. O próprio Jean-Baptiste Willermoz dedicou-se ao estudo do simbolismo alquímico presente nos ritos existentes em sua época.
Em 1814, aparece um livro muito curioso escrito por Vincent Tacxsi: “O católico suíço duas vezes, ou Doutrina Filosófica; dedicada aos verdadeiros Grandes Juízes Comendadores Filósofos Desc… e todos os membros da associação Mas...” [6]Paris, Imprimeire LG Michaud, rue des Bons Enfants, 1814. Encontramos, na página 236, “O Tabernáculo do Suíço Católico duas vezes, encontrado em manuscritos antigos da biblioteca do convento de Saint-Vincent de Lisbonne, em 1780, copiado exatamente, traduzido do português e latim para o francês, e cópia sob a guarda fiel de um maçom zeloso, em risco de ser preso a cada minuto”. Apesar do que o autor declara: “algo necessário que era a publicação da verdade que exponho ao público, ninguém se atreveu a tentá-la…”; o “Tabernáculo” nada mais é do que um plágio do “Grande Livro da Natureza” com omissões, numerosas variantes e certos acréscimos.
Em 1853, Ragon analisou meticulosamente “A Ordem dos Filósofos Desconhecidos”, em sua obra ‘Orthodoxie Maconnique” [7]Paris, Dentu, 1853, páginas 373 a 412, e que também é registrada textualmente na Enciclopédia Maçônica de Frau Abrines, Editorial Kier. Zaccone, em sua “História da Inquisição, dos Jesuítas e dos Franco-Maçons”, também consagrará um capítulo ao “Philosophes Inconnus”, resumindo sem citar o “L’Etoile Flamboyante”.
Deixando de lado os graus que aludem aos Filósofos Desconhecidos, não podemos atestar a existência real de uma Sociedade dos Filósofos Desconhecidos historicamente. A. E. Waite questiona a existência deles, indagando-se se existiam apenas na mente da ortodoxia maçônica. Robert Amadou declara que “nem a primeira Rose+Croix, nem os Filósofos Desconhecidos constituíram sociedades, eram ideias”. Ainda declara que, mesmo assim sendo, “sua ação na história não deve ser menos forte, pelo contrário…”.
Sobre tais ideias, Eliphas Levi, em seu “Dogma e Ritual de Alta Magia”, afirma, apontando para os Catecismos para o grau de Adepto ou Aprendiz Filósofo Sublime e Desconhecido, que “este catecismo, que nós indicamos aos sábios Cabalistas como capaz de substituir o incomparável ‘Tratado de Paracelso’, contém todos os verdadeiros princípios da Grande Obra de uma maneira tão satisfatória e tão clara que é necessário carecer de toda inteligência especial do ocultismo para não para alcançar a verdade absoluta, meditando-o”. Essa mesma ideia é apresentada nos escritos de Stanislas de Guaita, Oswald Wirth, A. E. Waite e Robert Amadou e do próprio barão Tschoudy. Existindo ou não tal Sociedade, percebe-se a importância e profundidade que grandes iniciados do passado dão somente a um único catecismo hermético ao qual ela é remontada.
Além dos diversos graus, ritos e regimes maçônicos que remontam aos Filósofos Desconhecidos, alguns escritores apontaram implicações de natureza política relacionadas entre a “Estrita Observância Templária”, jesuítas e jacobitas. Outros também viram os Superiores Desconhecidos como uma classe de iniciados que ocupam assentos de liderança em escolas iniciáticas, representando e assumindo o papel das “hierarquias ocultas”.
Deixando de lado as discussões sobre a existência ou não de uma “Sociedade dos Filósofos Desconhecidos”, catecismos, graus e rituais que os citam, suas supostas implicações políticas, se representam ou não as hierarquias dos planos ocultos nas ordens, podemos deslumbrar talvez o mais importante significado dado ao título de “Superior Desconhecido”: uma condição interna. E é assim que podemos reestabelecer a origem autêntica de seu significado seguindo o caminho daqueles que pretendem transmitir tal filiação.
Sendo assim, representam simbolicamente os Guardiões Ocultos da Tradição Primordial, os antigos e originais Rosa+Cruzes, os sacerdotes de todas as religiões, o sacerdócio de Melquisedeque, os Reis Magos que adoram o Salvador, os astrólogos, os alquimistas, os magos, os cabalistas, os teurgos, os guardiões do Santo Graal, a Hierarquia oculta do Templo. Sua transmissão é muito antiga, sendo Louis-Claude de Saint-Martin apenas um de seus representantes, sendo passada através de várias ordens e fraternidades esotéricas tradicionais, que se reconhecem pela iniciação, doutrinas e símbolos que compartilham e representam. Um Superior Desconhecido não diz que é um Superior Desconhecido, pois o silêncio é sua divisa[8]assim como o adágio Rosa+Cruz de quem um Rosa+Cruz nunca diz que é um Rosa+Cruz. Os iguais os reconhecem e também se reconhecem.
A Ordem que Papus criou chamava-se inicialmente “Sociedade dos Filósofos Desconhecidos”. Para ele, uma escola iniciática só é válida se houver uma transmissão iniciática envolvida. A transmissão dos Superiores Desconhecidos foi a que ele escolheu para validar a sua escola, a qual recebeu de seu iniciador pela roupagem dada pelos Mestres Passados Martinez de Pasqually, Jean-Baptiste Willermoz e Louis-Claude de Saint-Martin, dando especial ênfase a este último. Somente alguns anos mais tarde é que ele muda o seu nome e a transforma na “Ordem Martinista”, mas ainda assim focando na transmissão dos Filósofos Incógnitos.
Bebendo das fontes e mesmo dos veículos que a Tradição Esotérica Ocidental passou até chegar em seu coração, a Ordem de Papus não se deteve somente na doutrina martinista, incluindo temas sobre os quais Louis-Claude de Saint-Martin talvez nunca tenha se debruçado, sendo ela mesma um dos veículos dessa Tradição, através da roupagem de que ele a revestiu dentro da visão particular da escola francesa de Esoterismo Ocidental. Cada iniciado em seu movimento representa uma adaptação particular dos objetivos gerais. Sendo assim, cada Superior Desconhecido é um guardião dessa Tradição e cada escola martinista, sendo criada por um legítimo Livre Iniciador que recebeu uma transmissão legítima e os símbolos a ela vinculados, é guardiã e veículo dessa mesma transmissão. Mesmo adotando currículos variados, remete à mesma condição a qual todo Iniciado busca alcançar. A própria Ordem Martinista manifesta, internamente, diversas outras vias tornando-se também guardiã e perpetuadora das mais variadas correntes da Tradição Esotérica Ocidental e, por fim, ligando-se à fonte e coração desta mesma Tradição, ao Invisível, através do Iluminismo Rosa+Cruz. Assim, seja essa história real ou mítica, é veículo do ideal manifestado pela corrente dos Filósofos Desconhecidos, amalgamando em si todas as suas principais correntes e derivações, dentro da perspectiva francesa.
Referências
↑1 | uma de suas diversas versões foi publicada no Brasil pela “Ordem Rosacruz, AMORC” sob o título de “Símbolos Secretos do Rosacruzes dos Séculos XVII e XVIII” |
---|---|
↑2 | É relevante lembrar que “L’Ordre de l’Etoile Flamboyante” (“Ordem da Estrela Flamígera”) do Barão Tschoudy deu origem ao rito maçônico Adonhiramita. |
↑3 | esta sigla misteriosa recebeu as seguintes interpretações: ‘Atha Gadol Leholam Amem’ e ‘Ateh Gibor Leholam Adonai’, podendo significar desta forma “Oh Senhor, Tu és Todo-Poderoso eternamente” |
↑4 | Sob a máscara, o manto e o cordão. |
↑5 | republicado pela Librairie du merveilleux, em 1916 com uma introdução por Oswald Wirth |
↑6 | Paris, Imprimeire LG Michaud, rue des Bons Enfants, 1814 |
↑7 | Paris, Dentu, 1853, páginas 373 a 412, e que também é registrada textualmente na Enciclopédia Maçônica de Frau Abrines, Editorial Kier |
↑8 | assim como o adágio Rosa+Cruz de quem um Rosa+Cruz nunca diz que é um Rosa+Cruz |
Deixe uma resposta